Budapeste é uma das cidades mais bonitas da Europa. Eu passei quatro dias lá e, com certeza, poderia ter passado uma temporada bem mais longa.

Além de prédios lindos do século XIX, a cidade tem áreas verdes super agradáveis. Há muitas pistas para corrida e passeio de bicicleta: nas margens do rio Danúbio e nos muitos parques urbanos.

E, mesmo sendo uma cidade relativamente pequena (população de 1,7 milhão de habitantes, similar a de Curitiba), Budapeste tem tudo que as mais badaladas cidades europeias tem: bairros diferenciados que agradam da pessoa mais hipster à mais tradicional.

O mais curioso é que, até 1873, Budapeste não existia.

Buda e Peste eram duas cidades independentes, primeiro como parte do Reino da Hungria (896-1526), depois como parte do Império Otomano (1541-1686) e, depois, sob governo austríaco (1687-1867).

Foi apenas após a formação de uma monarquia dual em 1867, o Império Austro-Húngaro, que Buda e Peste foram unificadas.

Nosso passeio vai começar por Buda, na margem direita do rio Danúbio. O grande destaque dessa área é o “Distrito do Castelo” (Varnegyed).

Essa é a área nobre da cidade, desde o surgimento do Reino da Hungria, há mais de mil anos. Era lá que viviam os reis e a corte.

Depois vamos para Peste, do outro lado do rio. Desde seu surgimento como um assentamento eslavo, ela é um centro comercial.

Pequena em relação à vizinha Buda até o século XVIII, Peste passou por uma explosão demográfica no século XIX.

Foi esse lado da cidade que mais se desenvolveu a partir de então. E o que viveu de forma mais intensa os eventos dramáticos do século XX, como a controversa ocupação alemã durante a II Guerra Mundial, a ocupação soviética e a Revolução de 1956.

Nosso passeio vai ter tudo isso, começando com a chegada dos romanos no séc. II A.C. e terminando com um agradável passeio pela ilha Margit, no rio Danúbio, entre as belíssimas Buda e Peste.

Aquincum, a Cidade Romana

Quando os romanos chegaram no local onde hoje fica Buda, encontraram um assentamento celta chamado Ak-Ink (que significa “água abundante”).

Ak-Ink tinha uma posição privilegiada na malha de transportes do império.

A cidade ficava próxima ao rio Danúbio (que cruza a Europa no sentido leste-oeste), em uma área onde era fácil atravessá-lo.

Também passava perto de Ak-Ink uma estrada romana que ligava várias fortalezas do império ao longo do rio (já falamos sobre essa linha de defesa territorial, conhecida como Danube Limes, no post sobre a Bavária).

O assentamento celta Ak-Ink virou a cidade romana Aquincum, que seria capital da província Pannonia até o século IV.

Os romanos construíram duas fortalezas (uma em cada margem do rio) e mantiveram uma legião com seis mil soldados por ali.

Mas, assim como as outras cidades romanas ao longo do Danúbio, Aquincum foi abandonada no século IV.

Suas ruínas podem ser visitadas no sítio arqueológico da cidade.

Quando os hunos chegaram na região, no século V, encontraram a cidade deserta. Eles não ficaram muito tempo. Também passaram por lá povos visigodos e ávaros.

Mas foram os magiares, que chegaram no final do século IX, que permaneceram, dando origem à atual Hungria.

Buda, a cidade na margem direita do rio Danúbio (séc. X a XVI)

Os magiares eram tribos originárias da Sibéria. Sete tribos magiares uniram-se com três tribos turcas, formando a “Confederação das Dez Tribos” (On-Ogur).

Foi essa população que ocupou Buda e seus arredores no final do século IX.

Isso explica dois termos que usamos hoje: a própria palavra “húngaros”, que deriva da pronúncia eslava de On-Ogur, e “magiar”, que é como os próprios húngaros referem-se ao seu idioma e aos habitantes da Hungria.

Acredita-se que o líder da Confederação On-Ogur, Árpád, tenha se instalado no antigo palácio do governador romano.

Nas décadas seguintes, seus descendentes aproximaram-se dos vizinhos “civilizados”: os cristãos do Sacro Império Romano Germânico.

No ano 974, o bisneto de Árpád, Géza, foi recebido pelo imperador Otto II na então capital do império, a cidade alemã Quedlinburg.

No ano 995, o tataraneto de Árpad, István, casou-se com uma princesa da Bavária (um dos reinos que formavam o Sacro Império Romano Germânico).

Isso selou a aproximação dos húngaros, que até então eram pagãos, aos reinos cristãos.

Cinco anos depois, István seria coroado pelo Papa Silvestre II como o primeiro rei da Hungria.

A coroa usada nessa cerimônia pode ser vista no prédio do Parlamento Húngaro, nas margens do rio Danúbio.

Outra opção é ver sua versão em pedra na ponte Margit, uma das dez pontes que ligam os dois lados do rio.

A coroa do rei István é hoje um dos símbolos da nação húngara. Szent István – ou Santo Estevão – é o padroeiro do país.

Foi durante seu reinado que o assentamento magiar migrou de onde era a romana Aquincum para o local onde desenvolveu-se a Buda medieval (no alto de uma colina, a cerca de 5 quilômetros de distância). 

A antiga cidade romana passou a ser chamada Óbuda, que significa “Buda Antiga”.

Ela é hoje parte de Budapeste, na região conhecida como Terceiro Distrito.

Se você tiver tempo para conhecer essa área (próxima à ponte Árpád), os pontos centrais são as praças (tér) Fő e Flórián.

Já a colina onde os magiares instalaram-se ficou conhecida como “Colina do Castelo” e é hoje uma das principais áreas turísticas da cidade.

Lá a cidade cresceu e prosperou por dois séculos.

Colina do Castelo vista do outro lado do rio

Até um evento marcante da história da Hungria:  a invasão mongol de 1241-1242.

Os mongóis estavam no auge de seu império, iniciado por Gengis Khan.

Em 1241, eles rapidamente ocuparam a Hungria, forçando o rei Béla IV (1235-1270) a fugir.

Por um ano, a Hungria não existiu. Acredita-se que dois terços da população tenha morrido nesse período.

Os mongóis, sobre os quais já escrevi aqui, estiveram a um triz de ocupar o resto da Europa. E, de repente, retiraram-se da Hungria, por motivos que até hoje não são muito claros.

Bom para o rei Béla IV, que voltou para Buda e entrou na história da Hungria como seu “segundo fundador”.

Em seu longo reinado, ele conseguiu fortalecer o reino, tanto por meios diplomáticos (ele era casado com uma filha do imperador bizantino) quanto militares.

O grande legado para Buda foi a expansão do distrito do castelo (a cidade medieval) e o investimento em sua fortificação, o que possibilitou o desenvolvimento relativamente seguro da cidade nos séculos seguintes.

Buda só seria ocupada três séculos depois, pelo Império Otomano.

Passeio pelo Distrito do Castelo, a cidade dos reis da Hungria

Dentro dos muros onde uma vez desenvolveu-se a Buda medieval, as ruas mantém o traçado de séculos atrás.

Alguns prédios resistiram parcialmente às muitas invasões da cidade, e restaurações do século XX devolveram-lhes o charme original.

Vamos começar entendendo a região com esse mapa. Ele mostra a cidade dentro dos muros. Toda essa área é conhecida como Distrito do Castelo (Castle Hill ou Budai Vánegyed).

A igreja que se destaca na direita é a mais antiga da cidade, a Maria Madalena.

A outra igreja que se destaca no mapa, mais ao centro, é a igreja Mátyás. As torres na proximidade são conhecidas como “Baluastre dos Pescadores”. No lado esquerdo do mapa fica o palácio da família real.

Vamos falar de cada um deles a seguir.

Baluarte dos Pescadores (Fisherman’s Bastion)

Essa é, na minha opinião, a entrada mais imponente do Distrito do Castelo.

Os muros e as torres foram construídos no século XIX. As sete torres representam as sete tribos magiares que fundaram a Hungria.

O nome do monumento, Baluarte dos Pescadores, é uma homenagem ao Grêmio dos Pescadores, grupo de cidadãos que era responsável por defender esse lado da muralha durante a Idade Média.

Dos muros, têm-se uma das vistas mais bonitas para o rio e a cidade. E, chegando lá em cima, a gente está na frente de uma das igreja mais emblemáticas de Budapeste, a Igreja Mátyás.

Igreja Mátyás

Ela foi construída pelo rei Béla IV, logo depois dos invasores mongóis terem abandonado a Hungria.

Mas seu nome vem de um rei que governou mais de 100 anos depois, Mátyás Corvinus.

Ele é importante para a história do país porque foi o primeiro rei de origem húngara (ou magiar) desde o fim da dinastia de Árpád, em 1301.

Entre 1301 e 1458, embora a Hungria tenha mantido sua autonomia, seus reis eram governantes de outros países (como o rei da Polônia ou o rei da Boêmia).

Mátyás foi eleito pela nobreza húngara em 1458. Foi nessa igreja que ele assistiu a missa solene logo após sua coroação.

Também foi nela que ele casou-se: primeiro com a filha do rei da Boêmia (1463) e, depois, com uma princesa de Nápoles, Beatriz de Aragão (1475).

Seu último casamento é um indicador de seu interesse por cultura e arte, que floresciam nos reinos italianos nessa época.

Para a Hungria, esse casamento signifiou um grande avanço cultural: a corte de Mátyás passou a ser frequentada pelos melhores artistas e intelectuais da época.

A igreja Mátyás ainda seria palco de várias outras coroações, incluindo a da famosa Imperatriz Sissi (que também foi coroada rainha da Hungria) e a do último rei da Hungria, Charles IV (1916).

Igreja Maria Madalena

Ela começou a ser construída no século XIII, logo depois de os reis húngaros instalarem-se na colina.

Em uma ampliação no século XV foi construída a torre que está em pé até hoje. Ela é conhecida como Torre de Buda.

A igreja resistiu parcialmente aos bombardeios da II Guerra Mundial. Mas foi destruída logo depois. A torre foi deixada em pé e transformada em monumento.

No verão de 2017, a torre foi aberta ao público. Eu não subi, mas li que as vistas lá do alto são bem bonitas.

A cidade medieval

Reparou no mapa que mostrei antes que entre as duas igrejas há várias ruas e casas? Pois é, para mim, essa é a parte mais gostosa do Distrito do Castelo.

Ruas tranquilas e arborizadas, que existem há séculos e onde, até hoje, há moradores.

E algumas surpresas. Reparou o nome na porta da casa amarela?

É uma homenagem a um dos artistas mais famosos nascidos em Budapeste, o mágico Harry Houdini (1874-1926).

Ele viveu na cidade por apenas 4 anos: sua família emigrou para os Estados Unidos em 1878.

No prédio há um pequeno museu e sessões de mágica. Para mais informações, espie os reviews no Trip Advisor.

E já que estamos falando de húngaros famosos, vamos falar de Rubik. Ele é o criador desse cubo:

Ernő Rubik, escultor e professor de arquitetura, inventou a peça em 1974. Ela foi patenteada em 1976 e, conhecida como Cubo Mágico, virou febre no mundo inteiro na década de 1980.

Até hoje, já foram vendidas mais de 500 milhões de cópias do brinquedo (sem falar nas várias imitações que apareceram desde então).

É por isso que, em Budapeste, você vai ver várias versões do cubo mágico – inclusive em lojas de souvenir.

O palácio real

A área do palácio ocupa pelo menos um terço do Distrito do Castelo.

Ao contrário do resto do Distrito, onde há ruas e residências, esse trecho é mais “monumental”.

Há o palácio principal (em sua versão do final do século XVIII, em estilo barroco e rococó), alguns palacetes e vários jardins.

O palácio principal, reconstruído após a Segunda Guerra Mundial, abriga três instituições: o Museu da História de Budapeste (Vármúzeum), a Galeria Nacional de Arte e a Biblioteca Nacional.

A única maneira de conhecê-lo por dentro é entrando em uma dessas instituições (todas cobram ingresso).

Os jardins, ao contrário, são abertos ao público. Deles, têm-se uma vista linda para a cidade, para a ponte das correntes (Széchenyi, a mais antiga da cidade), para o prédio do Parlamento e para a ilha Margit, no meio do Danúbio.

Voltando aos jardins, um dos destaques é essa fonte, uma homenagem ao rei Mátyás.

Os palacetes restaurados também são lindos.

Esse, construído em 1901, era a Escola de Equitação. Ele funciona hoje como espaço de eventos.

O antigo prédio da Guarda Real foi transformado em um restaurante de luxo.

Já o Palácio Sándor manteve sua função governamental: o prédio do começo do século XIX é hoje o lugar de trabalho do presidente da Hungria.

Um último destaque nessa região é o Várkert Bazár, o prédio branco na beira do rio que enxergamos quando descemos a encosta pelo lado do palácio.

Construído no final do século XIX como uma área de lazer com lojas e jardins, o espaço estava abandonado no final do século XX.

Uma enorme restauração, que incluiu a transformação do espaço interior, criou um centro cultural onde ocorrem diversos tipos de eventos.

O que mais ver na margem direita do Danúbio

As outras duas colinas são menos populares, mas também interessantes.

Eu subi na Colina das Rosas (Rózsadomb) porque queria ver o monumento a um religioso importante do período da ocupação otomana (falaremos disso em seguida).

É bem interessante, não só pelo monumento, mas também por ser uma das áreas mais chiques (e caras) da cidade. Há muitos prédios e casas lindos, com vistas extraordinárias para o rio.

Não subi na terceira colina, a Gellert, famosa pelos banhos termais de mesmo nome. Também falaremos deles mais adiante.

Nessa colina fica um outro ponto turístico popular de Budapeste, a Citadela. Trata-se de uma fortaleza construída no século XIX pelos governantes austríacos.

A área está sendo restaurada, por isso acabei não subindo. Dizem que lá do alto (a montanha verde nessa foto) têm-se as melhores vistas da cidade.

Toda essa parte de Budapeste forma o XI Distrito, conhecido como Újbuda (que significa Buda Nova). A área é enorme.

O seu centro é a praça Móricz Zsigmond, que fica 15 minutos a pé do rio

Mas a parte mais surpreendente dessa região (pelo menos pra mim!) é um empreendimento novo que inclui mais de uma dezena de prédios comerciais e residenciais, o BudaPart.

Fonte: BudaPart

Do lado, fica uma área verde super estruturada, às margens do Danúbio, o Kopaszi-Gát.

É a cidade do século XXI, misturando-se à Buda medieval.

Entre as três montanhas desse lado do rio, eu caminhei muuuuito! E adorei.

Excluindo a colina do castelo, essa área da cidade tem poucos turistas – bem diferente do outro lado do rio.

E dá pra sentir melhor como é viver na cidade.

O meu hotel ficava nesse lado do rio.

Eu tinha uma vista espetacular para o Parlamento e, ao mesmo tempo, um acesso super fácil ao outro lado do rio – tanto a pé quanto com transporte público (trem de superfície e ônibus).

Peste, a cidade na margem esquerda do rio Danúbio (séc. X a XVI)

Lembra que eu falei que os romanos construíram duas fortalezas, uma de cada lado do rio?

Vestígios da fortaleza da margem esquerda, conhecida como Contra Aquincum, podem ser vistos atualmente na praça Március 15.

Depois do abandono pelos romanos, essa área foi ocupada por tribos eslavas. Sabe-se que elas já estavam lá quando os magiares chegaram na outra margem (final do século IX).

A primeira referência escrita ao assentamento na margem esquerda do rio é um documento do ano 1148.

Na época, o assentamento já era chamado de Peste, que significa “forno de cal” em idiomas eslavos. O documento deixa claro que Peste era uma cidade independente, com importância comercial.

A área onde ficava a Peste medieval é conhecida hoje como Belváros (que significa, simplesmente, centro da cidade).

Belváros

Bem sobre as ruínas da fortaleza romana, está a igreja mais antiga da cidade, a Nossa Senhora de Budapeste (em húngaro: Nagyboldogasszony Főplébánia), construída no século XI.

Se você entrar nela, vá direto ao subsolo, que é a parte mais interessante da igreja: uma antiga capela.

No andar principal, o destaque é um mihrab, que indica a direção de Meca. É um resquício do período otomano, quando a igreja foi transformada em mesquita.

Toda a região de Belváros foi cercada por muros durante a Idade Média.

Os primeiros foram construídos no século XIII, acredita-se que como uma medida para impedir os ataques dos mongóis.

Como já sabemos, não adiantou. Os mongóis ocuparam a região por cerca de um ano, período durante o qual os muros foram destruídos.

Uma nova muralha foi construída durante o reinado de Mátyás, no século XV.

Essa resistiu um pouco mais. Mas não foi suficiente para impedir a ocupação otomana do século XVI.

Quando os muçulmanos abandonaram a cidade, 150 anos depois, a muralha estava bastante danificada.

Mas ela continuou existindo até o século XVIII, quando o crescimento acelerado da cidade (e a tendência urbanística da época) levou à derrubada dos muros.

Ainda há vestígios da segunda muralha, mas não é fácil encontrá-los. Esse post do site WeLoveBudapest dá algumas pistas.

Ainda dentro da Peste Medieval fica uma das principais ruas de comércio da cidade, a rua (utca) Váci.

É uma rua de pedestres, que estende-se do Grande Mercado Central (Nagycsarnok) até a praça (tér) Vörösmarty.

O Mercado Central é bastante turístico, mas, ainda assim, vale dar uma caminhada por ele.

Além de ser um bom exemplo da arquitetura do final do século XIX, ele é um bom lugar para provar pratos típicos e comprar souvenirs.

A rua Váci é a mais tradicional rua de comércio de Budapeste. Podemos dizer que é o verdadeiro centro da cidade.

Ela estende-se por mais de um quilômetro, cortando a Peste medieval de ponta a ponta.

Chegando ao outro extremo, a praça Vörösmarty, você estará ao lado de uma das principais casas de concerto de Budapeste, a Vigadó.

É um prédio do século XIX, período em que a cidade estava sendo ampliada além dos antigos muros. Falaremos disso mais adiante.

Ocupação Otomana (séc. XVI e XVII)

Nesse outro post sobre a Hungria eu já contei como conflitos internos após a morte do rei Mátyás acabaram resultando na ocupação otomana de parte da Hungria por quase duzentos anos.

Naquela época, os otomanos já controlavam seu vasto império a partir de Constantinopla (hoje parte da Turquia).

A grande mudança para Budapeste nesse período é que os reis cristãos que viviam em Buda – húngaros, poloneses, etc – foram substituídos por governantes muçulmanos.

E assim seria até 1699, quando os otomanos assinaram um tratado com o rei austríaco, entregando seus territórios na Hungria (que incluiam Buda e Peste) para a Monarquia Habsburgo, que já governava o resto da Hungria, a Áustria e a Boêmia.

Um dos principais legados dos otomanos na Hungria são os banhos termais.

Na cultura muçulmana, o banho turco (ou hammam) era um ritual praticado por homens e mulheres regularmente. Havia centenas de espaços para banho em sua capital, Constantinopla (atual Istambul).

E eles criaram dezenas deles na Hungria durante os quase duzentos anos de ocupação.

Para conhecer mais sobre os otomanos em Budapeste, também vale a pena visitar o mausoléu de um líder religioso muçulmano que viveu no século XVI, Gül Baba.

Banhos Termais

Os muçulmanos introduziram na Hungria a cultura do Banho Turco (hammam)

Diferentemente dos banhos romanos, em que os cidadãos entravam em piscinas de águas termais ou águas aquecidas, o banho turco envolve movimento.

Em um hammam, a experiência começa aquecendo o corpo em uma sauna. Depois acontece o banho propriamente dito (individual, acompanhado por massagem ou esfoalição).

E o ritual termina com um enxague, que pode ser em uma piscina. As piscinas são, normalmente, octogonois e situadas abaixo de cúpulas que permitem a entrada de luz.

Há dois lugares em Budapeste em que as estruturas de banho turco costruídas pelos otomanos ainda estão ativas: o Rudas Baths e o Veli Bej Baths.

Ambos os prédios foram restaurados e ampliados e hoje são complexos de banho que incluem outras tradições e estilos: a cultura de banhos termais continuou desenvolvendo-se na cidade após a partida dos otomanos.

Os principais complexos de banho termal de Budapeste podem ser encontrados aqui. Os destaques são o Széchenyi, o Gellert e o Lukács.

O banho termal mais turístico de Budapeste na atualidade, o Széchenyi, surgiu no século XIX. Ele foi o primeiro complexo de banhos termais na margem esquerda do Danúbio (Peste).

Ele diferencia-se dos outros porque, além da estrutura de piscinas, saunas e serviços terapêuticos oferecidos pelos outros SPAs da cidade, o Széchenyi é um grande complexo de lazer.

Nas piscinas externas é possível jogar xadrez. Para os apreciadores de cerveja há um banho termal temático. E, nas sextas-feiras, tem balada com DJs (Sparties)

Mais clássico, de volta a Buda, no outro lado do rio, encontramos o SPA Gellert.

Ele fica no pé da colina de mesmo nome. Aberto em 1918, ele destaca-se por sua decoração em estilo art noveau.

São 8 piscinas e 7 saunas (cinco secas e duas úmidas).

Outro SPA bastante tradicional, com várias piscinas e saunas, só que mais orientado para a área medicinal é o Lukács.

Para conhecer mais sobre a cultura de banhos termais em Budapeste, confira esse artigo da Lonely Planet.

Mausoléu de Gül Baba

Lembra que eu falei que a terceira colina de Buda é conhecida como “colina das rosas”? Esse nome é recente e está relacionado a um mausoléu que existe lá em cima.

É o mausoleu de Gül Baba, um líder religioso otomano que participou do cerco à Budapeste em 1541.

Relatos de um viajante e escritor do século XVII dizem que o próprio sultão participou de seu enterro nesse local, onde alguns anos depois foi construído um mausoléu.

Há muitas teorias sobre o significado do nome Gül Baba. A mais comum é de que o termo significa “pai das rosas” – daí o nome da colina.

Quando os otomanos saíram de Budapeste, o mausoléu de Gül Baba foi abandonado. Por duzentos anos houve uma capela cristã no local.

No final do século XIX, numa fase de reaproximação entre os governos húngaro e otomano, o governo otomano reconstruiu o mausoléu.

Vale a pena visitá-lo: o local é tranquilo, bonito e cheio de mansões e edifícios de luxo – a região da colina das rosas é uma das mais chiques de Budapeste.

Buda, Peste e Áustria (séc. XVIII – XX)

Na prática, a saída dos otomanos da Hungria simplesmente significava que seus territórios agora estavam sob o governo da dinastia Habsburgo, que controlava a Áustria e a Boêmia.

Os Habsburgos também tinham o título de imperadores do Sacro Império Romano Germânico (atual Alemanha e norte da Itália).

Buda e Peste foram reconhecidas como “cidades livres” em 1703. A aristocracia cristã voltou a instalar-se em Buda, que, até então, era a cidade com maior população.

Mas, ao longo do século XVIII, foi Peste que mais cresceu, indo de menos de três mil habitantes para quase trinta mil.

O começo do século XIX foi um período de transformação para a dinastia Habsburgo: a ascensão de Napoleão resultou na extinção do Sacro Império Romano Germânico e na criação do Império Austríaco (estratégia dos Habsburgos para não deixarem de ser imperadores).

Formavam o novo Império Austríaco a própria Áustria, a Hungria, a Boêmia e a atual Croácia.

Por cerca de cem anos os húngaros aceitaram submeter-se ao império austríaco – o idioma mais falado na Hungria nessa época era o alemão.

Mas, ao longo do século XIX, acompanhando os movimentos nacionalistas do resto da Europa, os intelectuais húngaros promoveram o retorno ao idioma e à cultura magiar.

O movimento tornou-se também político, com a Hungria declarando-se independente da Áustria em 1849. A única maneira da Áustria impedir essa separação foi contando com a ajuda militar do império russo.

Mas era cada vez mais difícil para os austríacos manterem o controle sobre a Hungria, o que levou a um acordo: a formação de uma monarquia dual, com sedes em Viena e Budapeste.

Foi nessa época que começou a história de amor entre os húngaros e a imperatriz austríaca, Elisabete.

Dizem que foi a aproximação dela com o coronel húngaro Gyula Andrássy alguns anos antes que facilitou a negociação do acordo que formou o Império Austro-Húngaro em 1867.

Elisabete era fluente no dificílimo idioma húngaro e passava longas temporadas com os filhos no palácio Gödöllö, a 30 quilômetros de Budapeste.

A imperatriz Elisabete tornou-se popular no mundo inteiro na década de 1950, quando foi lançada a trilogia de filmes Sissi, inspirada em sua vida (trailer do primeiro filme aqui).

O período do Império Austro Húngaro (1867-1914) é muito visível na Budapeste de hoje: esse foi o tempo em que Buda e Peste foram oficialmente unidas (1873) e em que a arquitetura da cidade foi transformada, adquirindo o ar imperial que mantém ainda hoje.

A Budapeste do século XIX

Lipótváros (junto com Belváros, forma o Quinto Distrito)

Após a derrubada dos muros, surgiu um bairro novo na beira do Danúbio: Lipótváros.

Ele começou na atual praça Vigadó, onde existia uma pequena fortificação que protegia o extremo norte da Peste Medieval.

A fortificação foi destruída em 1789, para dar espaço para a construção de um teatro. O prédio, onde hoje fica a sala de concerto Vigadó, ficou pronto em 1833. Na época ele era chamado Redoute.

Os grandes nomes da música clássica apresentaram-se no local, incluindo Johann Strauss II, compositor de uma das valsas mais famosas do mundo, Danúbio Azul.

O prédio foi destruído em 1849, quando a Hungria tentou tornar-se independente e foi impedida pelos austríacos. Mas foi logo reconstruído: em 1864 ficou pronto o novo prédio, que foi chamado Vigadó.

Por décadas, foi lá que aconteceram os principais eventos artísticos da cidade, incluindo uma homenagem aos 50 anos de carreira do compositor húngaro Ferenc (Franz) Lizst e um concerto conjunto de Litzt e Wagner para obtenção de fundos para a casa de concerto de Wagner em Bayreuth (sobre a qual já falamos aqui).

Desde 1954, o Vigadó é considerado patrimônio nacional, o que possibilitou sua reconstrução após ter sido praticamente destruído durante a II Guerra Mundial.

Ele foi reaberto ao público em 1980 e restaurado no começo do século XXI, o que resgatou o seu esplendor do final do século XIX.

Para conhecer o prédio por dentro, você encontra todos os detalhes aqui.

Todo teatro que se preze tem por perto um grande café, onde artistas e intelectuais se encontram. Atrás do Vigadó, temos o Gerbeaud, um símbolo da cidade desde o ano 1870.

Esse artigo tem várias fotos do interior do café.

Mas voltando à história da expansão da cidade: a inauguração da casa de concertos em 1833 foi apenas o início de uma grande ampliação.

Também no século XIX começou a construção da Basílica de Santo Estevão, que é a maior igreja de Budapeste.

Para os religiosos, seu maior destaque é sua principal relíquia: a mão direita do primeiro rei da Hungria (o santificado Estevão).

Para os laicos, a grande atração são os concertos de música clássica, que acontecem várias vezes por semana.

Também no final do século XIX foi construída nessa região a obra que é um dos símbolos de Budapeste: o prédio do parlamento.

Sua construção começou logo após o compromisso entre Áustria e Hungria que resultou na formação do Império Austro-Húngaro (1867).

Terézváros (Sexto Distrito)

A expansão da cidade no século XIX não limitou-se às margens do Danúbio. Praticamente atrás da Basílica de Santo Estevão, ainda em 1872, começou a construção da avenida Andrássy.

Ela é considerada “a Champs-Élysées de Budapeste”: a larga avenida está repleta de mansões, prédios renascentistas e lojas das maiores grifes do mundo.

Nela também está outro dos destaques arquitetônicos da cidade, a Casa de Ópera da Hungria (State Opera).

O prédio em estilo neo-renascentista foi inaugurado em 1884, com a presença do imperador.

A avenida Andrássy estende-se por cerca de 2,5 quilômetros, terminando no Parque da Cidade (em húngaro: Városliget), que é uma das principais áreas verdes de Budapeste.

Só o parque rende um dia de passeio!

Nele ficam as termas Széchenyi, de que falamos antes.

Provavelmente a parte mais famosa do parque é a Praça dos Heróis, onde está esse monumento em homenagem aos mil anos do reino da Hungria (1896).

Ao redor da coluna estão representações dos líderes das sete tribos magiares que deram origem ao reino da Hungria.

As outras estátuas representam figuras históricas, incluindo os reis Béla IV e Mátyás dos quais falamos antes.

Na mesma época da construção da praça dos heróis, também como parte das celebrações dos mil anos do reino da Hungria, foi construído esse castelo no parque.

O castelo Vajdahunyad representa a arquitetura da Hungria ao longo de seus mil anos de existência, incluindo os estilos românico, gótico, renascentista e barroco.

No seu interior funciona um museu que conta a história do desenvolvimento da agricultura no país.

A entrada principal do castelo foi construída sobre as ruínas de uma entrada de castelo medieval.

Se você gosta de museus, pode aproveitar o passeio pelo parque para visitar o Museu de Belas Artes, do ladinho da Praça dos Heróis.

Erzsébetváros (Sétimo Distrito)

Quando Buda e Peste foram oficialmente unidas (1873), na margem esquerda do Danúbio havia dois bairros (Belvaros e Litopvaros).

Atrás deles e antes da chegada no parque da cidade (Városliget) havia um área praticamente rural chamada Terézvaros.

Como parte da nova organização administrativa da cidade, a parte sul do bairro (para baixo da rua Kiraly) tornou-se um novo distrito.

Esse novo distrito era o mais densamente povoado da cidade, e sua população era formada basicamente por operários, prestadores de serviços e pequenos comerciantes.

Os moradores do novo distrito resolveram batizá-lo homenageando a imperatriz Elisabete. Ela deu sua permissão em 1882 e, desde então, o distrito é chamado Erzsébetváros (cidade de Elisabete).

Também havia muitos judeus vivendo na região, que, já naquela época, tinha várias sinagogas. Três delas estão em pé até hoje.

A mais imponente é a Sinagoga Central, que fica na rua Dohány. Ela é um símbolo da riqueza da população judia de Budapeste no século XIX.

Quando decidiu-se por sua construção foi aberto um concurso para escolha do projeto. O vencedor foi um arquiteto e professor da faculdade de Viena, que propôs esse belo prédio em estilo mudejár:

O prédio foi construído em apenas 4 anos, sendo inaugurado em 1859.

Já a sinagoga da rua Rumbach foi finalizada em 1873.

Durante os tristes episódio da II Guerra Mundial, foi nela que mais de vinte mil judeus que não tinham nacionalidade húngara foram presos para, posteriormente, serem deportados para campos de concentração.

Mais de dois mil judeus que morreram no gueto de Budapeste estão enterrados no pátio da sinagoga, que esteve fechada por muitas décadas.

Ela começou a ser restaurada em 2014 e foi reinaugurada em 2021.

A mais nova das três sinagogas é a da rua Kazinczy.

Ela foi construída a partir de 1909, quando a comunidade de judeus ortodoxos decidiu fazer um complexo de prédios que incluiria uma sinagora, uma escola, casa para estudantes, o apartamento do rabino e uma cantina.

O complexo foi construído entre 1911 e 1913. A sinagoga da rua Kazinczy é a única de Budapeste construída em estilo art noveau.

Aqui tem uma foto linda do seu interior.

Essa sinagoga costuma aceitar visitas de turistas (o complexo conta com um restaurante kosher), mas está temporariamente fechada enquanto escrevo esse post.

Curiosamente, a estreita rua Kazinczy tornou-se o centro hipster da cidade no século XXI.

Falaremos mais sobre isso em seguida.

O complexo século XX

Foi nessa parte da Europa que a I Guerra Mundial começou.

O assassinato do herdeiro do Império Austro-Húngaro, Franz Ferdinand, disparou uma série de acordos internacionais de proteção mútua que resultou no rápido envolvimento da Rússia, Alemanha, França e Inglaterra no conflito.

A guerra levou à dissolução do Império Austro-Húngaro. O destino da Hungria foi estabelecido pelo Tratado de Trianon, que reduziu seu território para apenas 30% do anterior à guerra.

Sua população de mais de 20 milhões de habitantes foi reduzida para menos de 8 milhões.

Das pessoas que tinham o idioma magiar como nativo (10 milhões), pelo menos 30% ficou de fora dos novos limites do país (suas casas agora sendo parte da Romênia, Tchecolosváquia, Iugoslávia ou Áustria).

A nova Hungria restaurou a monarquia sob a dinastia Habsburgo e indicou um regente húngaro, Miklos Horthy, personagem bastante controverso.

Ele estabeleceu um parlamento, mas, à medida que a crise econômica e social crescia, ampliou mais e mais sua própria intervenção no governo.

Embora não admirasse Hitler, a similaridade da situação sócio-econômica da Alemanha e da Hungria no período entre guerras, fez com que ele alinhasse a Hungria junto com a Alemanha na II Guerra Mundial.

Quase no final da guerra (outubro de 1944), ele mudou de ideia. Hitler não gostou, ocupou a Hungria, prendeu seu antigo aliado e colocou no poder Ferenc Szálasi, líder de uma organização fascista húngara.

Assim como na Alemanha, a população estava dividida.

Cerca de 500 mil judeus, ciganos e homossexuais foram deportados para campos de concentração nos meses finais da guerra, com apoio de muitos húngaros.

Outras centenas de milhares de judeus, ciganos e homossexuais foram escondidos e salvos por outros húngaros, que colocaram sua vida em risco para proteger essa população.

A chegada do Exército Vermelho (abril de 1945) terminou com o regime fascista, mas trouxe outro tipo de terror à população.

Milhares de pessoas foram estupradas, presas, deportadas e submetidas a trabalhos forçados pelos soviéticos.

A disputa entre alemães e soviéticos por Budapeste causou um estrago imenso à infraestrutura da cidade. Um quarto das fábricas e prédios foram danificados e todas as pontes foram destruídas.

O acordo de paz de 1947 reestabeleceu as fronteiras de 1920, impôs novas reparações de guerra, limitou as forças armadas do país e estabeleceu que, para garantir a execução do tratado, uma força de ocupação soviética supervisionaria a Hungria.

A presença soviética no país estendeu-se até 1991.

O modelo de economia planificado possibilitou a rápida reconstrução da estrutura básica.

Na década de 1950, Budapeste foi ampliada com a incorporação de sete cidades-satélite e dezesseis pequenas localidades à capital.

A questão política, entretanto, era delicada. Em 1956, um protesto pacífico de estudantes em Budapeste transformou-se em uma revolução.

Os soviéticos reagiram rapidamente, contendo o movimento em poucas semanas. Cerca de 200 mil húngaros abandonaram o país nesse período.

Após a revolta, foi instaurado um novo governo no país, o que resultou no que ficaria conhecido como “socialismo goulash” (goulash é o prato típico da Hungria).

Era uma combinação da economia planificada comunista com o capitalismo de mercado.

Budapeste logo seria conhecida como a cidade mais ocidentalizada do bloco soviético.

A partir de 1980 começou uma fase consistente de transição para a democracia, que resultou em eleições livres em 1990.

Em 1987, a UNESCO declarou a cidade de Budapeste como Patrimônio da Humanidade, o que contribuiu para que, nas décadas seguintes, ela se tornasse um dos principais destinos turísticos da Europa.

A Hungria entrou na Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) em 1999 e na União Europeia em 2004.

Seu atual primeiro-ministro, Viktor Orbán, é polêmico.

O país, sob sua liderança desde 2010, tem visto crescimento econômico e redução da desigualdade.

Ao mesmo tempo, Orbán é acusado de repressão das liberdades democráticas, censura à imprensa e preconceito em relação aos imigrates, o que tem causado conflitos com a União Europeia.

Onde ver a Budapeste dos últimos cem anos

Praça da Liberdade

Pertinho do Parlamento está a única homenagem aos soviéticos que permaneceu na cidade após 1991.

É um monumento aos soldados que perderam a vida libertando Budapeste dos nazistas em 1944-45.

Todos os outros monumentos e estátuas representando líderes soviéticos foram removidos para um campo fora da cidade, que foi transformado em um museu a céu aberto chamado Memento Park.

Esse artigo da BBC narra a visita de um britânico ao local. Ele destaca que não se trata de uma apologia ao período comunista, mas, sim, sobre guardar a memória sobre (e fazer as pazes com) eventos do passado.

Mas voltemos ao monumento aos soldados soviéticos.

Como você pode imaginar, sua permanência no centro da cidade, mais precisamente na Praça da Liberdade (Szabadsá tér), é bastante polêmica.

Enquanto alguns acham justo homenagear os soldados, outros consideram a obra uma homenagem ao regime.

Ironicamente, a embaixada dos Estados Unidos fica exatamente na frente do monumento.

Sua contribuição para o parque foi uma estátua de Ronald Reagan (2011) e outra de George Bush (2020), considerados presidentes americanos exemplares no combate ao comunismo.

As duas estátuas estão ao lado do monumento aos soldados soviéticos.

Ainda mais polêmico foi o monumento colocado na mesma praça, em 2014, em memória aos  70 anos do holocausto.

A escolha da obra foi feita sem consulta à comunidade judaica. Quando o monumento foi revelado, ele foi extremamente criticado.

Os críticos dizem que a águia, representado a Alemanha, e o arcanjo Gabriel, representando a Hungria, indicam que a Hungria foi vítima dos alemães, o que não é verdade: os países foram aliados durante a guerra.

Os críticos alegam que a suposta homenagem é, na verdade, uma tentativa de reescrever a história ignorando o fato de que muitos húngaros contribuíram para o holocausto.

Para entender melhor a polêmica em relação aos monumentos da Praça da Liberdade, confira esse artigo do blog FailedArchitecture.

Menos polêmico é o monumento à revolução de 1956, no Parque da Cidade (Városliget), pertinho da Praça dos Heróis.

Ele é formado por colunas de metal de diferente tamanhos, representando a individualidade das pessoas que, juntas, lutaram por liberdade naquele ano.

Erzsébetváros, o bairro judeu

Quando os alemães ocuparam Budapeste no final de 1944, os cerca de 70 mil judeus que ainda estavam na cidade foram movidos para um gueto entre as ruas Kiraly e Dohany. As condições de vida eram super precárias (mais detalhes aqui).

O gueto existiu por sete semanas, até a chegada dos soviéticos que liberaram a cidade. Estima-se que, durante aquele inverno, cerca de vinte mil pessoas tenham sido executadas.

Muitas delas foram mortas na beira do rio Danúbio, por simples conveniência: a correnteza levaria seus corpos. O detalhe sórdido: antes da execução eles eram obrigados a tirar seus sapatos – artigos valiosos em tempos de guerra.

Em memória a esse triste evento, foi criado um conjunto de esculturas na cidade, conhecido como Sapatos na Beira do Danúbio e inaugurado em 2005.

São 60 pares de sapatos de diferentes tamanhos e estilos representando a variedade de pessoas que perderam a vida naqueles dias trágicos.

Curiosamente, a região onde o gueto existiu é hoje uma das áreas mais animadas da cidade.

Isso começou quando um grupo de estudantes, em 2004, resolveu abrir um bar com bebida barata que pudesse ser frequentado por qualquer um.

O local que eles encontraram foi um prédio em ruínas nesse bairro. Lá eles abriram o Szimpla Kert (que signfica “jardim simples”).

A idéia foi um sucesso. Logo outros prédios em ruínas foram transformados em bares, criando uma categoria conhecida como romkocsma (húngaro para “bares em ruínas”).

Eu entrei no pioneiro, o Szimpla Kert, que é hoje uma das principais atrações turísticas da cidade. Ele fica na rua Kazinczy, onde um dia foi o gueto de Budapeste.

O bar é enorme, com várias peças decoradas com móveis e objetos de segunda mão.

Para conhecer alguns dos muitos bares em ruínas da cidade, você pode começar espiando essa lista.

Mas nem só de bares em ruínas vive essa região. Gentrificada nas duas últimas décadas, ela é o lugar ideal para quem procura por food trucks, design shops, cafés especiais e lojas alternativas.

Um dos destaques é o Gozsdu Udvar, um conjunto de galerias com dezenas de restaurante, bares e lojas.

E se você está procurando um lugar onde provar comida húngara, recomendo o Gettó Gulyás, que fica entre o Zsimpla Kert e o Gozsdu Udvar.

Fui e gostei muito!

Segredos de Budapeste

Vamos encerrar nosso passeio explorando um lugar e conhecendo uma pessoa que são pouco conhecidos pelos turistas.

O lugar é a ilha Margit, que pode ser acessada a partir da ponte de mesmo nome (a mais próxima do prédio do Parlamento).

Ela tem esse nome em homenagem à princesa Margit, filha do rei Béla IV, que viveu no convento que existia na ilha. Seu túmulo está ainda lá.

A ilha tem quase três quilômetros de extensão e é um lugar habitual de passeio dos moradores da cidade, especialmente nos finais de semana.

Ela tem uma área de bares, um cinema ao ar-livre, suas próprias termas (o SPA Palatinus), várias quadras de esporte, uma pista de corrida, vários hoteis e uma fonte de águas dançantes.

Eu tive muita sorte: visitei a ilha por acaso, num fim de tarde de domingo de verão. O clima é uma delícia.

A pessoa é o escultor Mihály Kolodko.

Nascido na Ucrânia, ele vem espalhando suas mini-esculturas pelas ruas de Budapeste desde 2017.

Elas passam quase desapercebidas. Às vezes, mesmo sabendo onde elas deveriam estar, é difícil encontrá-las.

Todas são muito fofas! Algumas são carregadas de significado político.

Se você decidir passar horas procurando pelas miniaturas, não vai ser o primeiro. Esse post te ajuda a encontrar o caminho pela cidade.

Divirta-se!!