Conhecer a Irlanda também é aprender um pouquinho sobre os Vikings. Eles chegaram no país a partir do ano 795, em pequenos grupos, atacando cidades próximas da costa.
Eles saqueavam mosteiros e vilas e, em seguida, voltavam rapidamente para seus navios.
Foi apenas a partir do ano 837 que eles começaram a ir para o interior, navegando pelos rios e, a partir do ano 840, eles passaram a permanecer na Irlanda durante os invernos.
Foi nessa época que começaram a construir portos fortificados, chamados de longphorts. Esses portos deram origem às primeiras cidades irlandesas. Até então eram os monastérios (de que falamos nesse outro post) que eram os centros de aprendizado e cultura.
Já as cidades fundadas pelos vikings eram centros comerciais. Foi graças a esse povo que produtos de toda a Europa passaram a chegar ao interior da Irlanda, onde eles fundaram cidades como Limerick e Cork.
Nessas cidades e nos pequenos reinos que iam formando-se ao redor delas, os vikings implementaram novos modelos de administração.
Os Vikings também levaram para a Irlanda técnicas avançadas de construção de navios e agricultura.
Mas eles nunca conquistaram toda a Irlanda e, aos poucos, foram passando a fazer parte da já estabelecida estrutura política e social irlandesa.
Como nem vikings nem irlandeses eram unidos entre si, diversas alianças entre esses grupos foram sendo formadas, principalmente por meio de casamentos entre membros da elite.
Costuma-se dizer que a “era Viking” acabou na Batalha de Clontarf, no ano 1014.
Nessa batalha, o exército do rei irlandês Brian Bórú, que controlou praticamente toda a Irlanda entre 1002 e 1014, derrotou os vikings de Dublin.
Mas os vikings não abandonaram completamente a ilha. Eles ainda mantiveram controle sobre suas cidades até o século XII e, a essas alturas, já estavam incorporados à sociedade irlandesa.
Se você quer saber que lugares visitar para conhecer mais sobre a história dos Vikings na Irlanda, sugiro a leitura desse post do blog Hand Luggage Only.
A chegada dos Normandos
Após a morte de Brian Bórú, os diversos reis irlandeses voltaram a lutar uns contra os outros. E um deles, em 1167, tomou uma decisão que mudaria a história da Irlanda: Diarmait Mac Murchada, rei de Leinster, pediu ajuda a Henrique II, rei da Inglaterra.
Henrique II autorizou Diarmait a recrutar a nobreza normanda para lhe ajudar.
Os Normados habitavam o noroeste da França. Originalmente eles também eram vikings, mas de um outro grupo, que se estabeleceu no continente mais ou menos na mesma época em que outros grupos vikings chegavam à Irlanda.
Os Normandos tinham uma característica importante: eles eram “imitadores” e tinham uma extrema facilidade para se misturar aos povos das terras que ocupavam.
Apesar de terem adotado o francês como idioma, terem convertido-se ao cristianismo e terem transformado a Normandia em um dos estados mais feudalizados da Europa Ocidental, não deixaram de ser grandes guerreiros e aventureiros. E expandiram-se por grande parte do continente.
O maior feito dos Normandos foi a invasão da Inglaterra, em 1066, que ficou conhecida como a conquista normanda.
Como eu estava contando antes, os Normandos foram “convidados” a entrar na Irlanda em 1167, para ajudar um dos reis irlandeses em uma das comuns disputas internas.
Foi assim que um grupo deles, liderado por Richard de Clare (também conhecido como Richard Strongbow), entrou na Irlanda. Isso teve duas consequências importantes.
A primeira foi uma posterior invasão inglesa, liderada por Henrique II, aquele que havia autorizado os Normandos a auxiliarem Diarmait.
Henrique II tinha como principal objetivo evitar a formação de um poder Normando na Irlanda que ameaçasse a Inglaterra.
Por isso ele garantiu a implemetação do controle inglês sobre o país, e esse controle durou mais de 700 anos.
A segunda consequência foi a formação de um novo grupo sócio-cultural, resultante de casamentos entre irlandeses e normandos. Eles passaram a ser conhecidos como anglo-normandos.
Castelos Medievais & Hollywood
Os normandos eram experts na arte de construir castelos.
Parte da estratégia de Henrique II para manter o controle inglês sobre a Irlanda foi ceder o reino de Meath para seu aliado Hugh de Lacy.
E ele construiu o castelo de Trim, um dos mais antigos castelos irlandeses, que está em pé até hoje.
O maior castelo anglo-normando da Irlanda ficou conhecido mundialmente quando virou cenário do filme Coração Valente (Braveheart), estrelado por Mel Gibson e vencedor de 5 prêmios no Oscar de 1996.
Na vida real, o castelo teve um papel importante como centro administrativo de Meath durante a Idade Média.
No filme, o castelo representou a cidade de York. E uma de suas áreas foi transformada para representar a praça de Londres.
Para entrar no castelo, é preciso fazer uma visita guiada, que eu achei super interessante.
Os guias mostram todas as armadilhas que existem dentro do castelo e as peculiaridades da vida em uma época em que um ataque inimigo podia acontecer a qualquer momento.
O mais bizarro da constução é que o “roupeiro” do senhor do castelo ficava acima da latrina.
Por um motivo bastante lógico: o cheiro das fezes matava os piolhos e outros insetos que se acumulavam dentro das roupas de lã, que estavam sempre úmidas em função do clima da ilha.
Que nojo!!! Coisas que a gente aprende visitando castelos medievais 🙂
O castelo de Trim fica a 50 km do aeroporto de Dublin e é uma das atrações da Rota do Vale do rio Boyne (Boyne Valley Driving Route), de que eu falei nesse outro post.
O site Move Locations mostra outros lugares da região que também foram cenário do filme Coração Valente.
Outros Castelos e Cidades
A Irlanda tem ainda muitos, muitos outros castelos. E vários deles podem ser visitados.
Esse post do blog Enjoy Irish Culture explica como sua função e estilo foi mudando ao longo dos séculos e, também, tem links para outros posts contando mais sobre pelo menos uns 20 deles.
A gente visitou o Dunguaire Castle, perto da Rota do Atlântico Selvagem.
Dunguaire, construído no século XVI, é famoso por seus banquetes.
Conta a lenda que, um dia, o senhor do castelo, Guire, estava oferecendo um banquete.
Nesse mesmo momento, São Colman (um santo irlandês) terminava um jejum de 40 dias e pedia a Deus que o alimentasse.
A comida, então, teria saido voando dos pratos do banquete de Guire e ido até Carron, onde São Colman estava.
Quando o castelo foi restaurado no século XX e passou a ser uma das principais atrações turísticas da região, passou a oferecer, lógico, banquetes medievais.A gente fez apenas uma visita rápida, mas incrementou o nosso próprio banquete comprando uma garrafa de hidromel (em inglês, mead).
O hidromel, bebida alcoólica fermentada a partir do mel, é uma das bebidas alcóolicas mais antigas do mundo.
Possivelmente começou a ser produzida antes do vinho e da cerveja. Algumas fontes dizem que era ela “o néctar dos deuses do Olimpo”, que aparece na mitologia grega.
A bebida foi muito popular na Idade Média. Na literatura celta e anglo saxônica, o hidromel é citado como “a bebida dos reis”.
Uma curiosidade: recentemente, o hidromel voltou a se popularizar: segundo artigo do New York Times, em 2015 já haviam 300 empresas produzindo hidromel nos Estados Unidos.
Galway
Para acabar nosso passeio, fomos até uma antiga vila de pescadores que foi ocupada pelos anglo-normandos no século XIII.
Ela é Galway, hoje a quinta maior cidade da Irlanda (apesar de ter apenas pouco mais de 70 mil habitantes), que fica a apenas 30 km do Dunguaire Castle.
Galway é atualmente uma cidade universitária, que tem uma das mais jovens populações da Europa.
E atrai muitos brasileiros que querem aprender inglês num lugar relativamente barato e onde é possível trabalhar com visto de estudante (esse post do e-Dublin explica melhor isso).
Galway nos surpreendeu, por ser muito diferente dos outros lugares por onde passamos. Quando a gente chega na cidade, ela parece ser muito maior do que é.
Há muitas estradas e avenidas largas, muitos carros, centros comerciais gigantes com estacionamentos enormes. Tudo muito desproporcional à população da cidade.
Quando finalmente chegamos no centro, aí sim, passamos novamente a nos sentir em uma típica cidade irlandesa, com suas ruas de pedras e casas coloridas.
Para terminar
A principal fonte que usei para escrever esse post foi o livro “A pocket history of Ireland“, de Joseph McCullough.
Se você tiver interesse em saber mais sobre os Normandos, recomendo esse artigo da Britannica, que é super completo.
E se você quiser saber mais sobre os Vikings, sua origem e mitologia, pode também o post Para entender a Noruega.
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